segunda-feira, 9 de junho de 2014

Anticonstitucionalissimamente

Não tenho o menor know-how jurídico, mas consigo constatar que deixou de se discutir política para se discutir legalidades. Na legislatura de Sócrates, era Cavaco quem fazia sentir o poder do seu veto em questões em que a legitimidade da sua intervenção é duvidosa, como esta ou esta, deixando passar em claro medidas ruinosas para a economia; nesta parece ser o Tribunal Constitucional a travar os cortes avulsos deste precipitado governo. A função pública, protegida que está pelo sistema e pela própria jurisprudência, vai acabar por cair desamparada, em vez de descer paulatinamente as escadas imperativas da reforma.

A incompetência deste Executivo parece-me, por isso, evidente. Faz-me confusão, isso sim, é que a oposição se preocupe mais em verificar a constitucionalidade de uma decisão governativa em vez de a analisar politicamente e, em caso de discordância, explicar o porquê e apresentar soluções. Quando uma proposta é rejeitada indeliberadamente, ainda para mais baseada em princípios ambíguos, já não se discute se uma solução é viável e positiva politicamente e passa-se a discutir se esta vai contra os dogmas inquestionáveis. A Constituição, como já o disse em tempos, é encarada com uma deidade que não merece. Não a Constituição enquanto entidade, mas sim a nossa em específico, escandalosamente necessitada de uma legítima actualização.

Dito isto, tenho de observar que as figuras a que o Governo se está a prestar desde o acórdão são lamentáveis. Esta incursão pública contra o TC e seus elementos é ir contra a separação de poderes que tanto evocam. É eticamente reprovável e politicamente pouco inteligente. Entendo que o governo se sinta de mãos atadas, num contexto excepcional, ao ser limitado por interpretações judiciais que dificilmente não têm preconceito político. Mas a verdade também é que o TC, por linhas muito tortas, já travou algumas autênticas irreflexões do Executivo. Se a emenda acabará por ser pior do que o soneto, o tempo o dirá.

Sem comentários:

Enviar um comentário