domingo, 13 de janeiro de 2013

Os Três Pintelhos do Apocalipse Mediático


É um fenómeno recorrente que as notícias de questionável relevância acabem por ser das mais debatidas. Esta última semana foi pródiga da proliferação de pintelhos catroguianos. Dois a nível local, um nos inevitáveis Estados Unidos, onde os pintelhos compõem um denso matagal. Como pintelhos que são, optaria sempre por ignora-los. No entanto, a dimensão que atingiram merece ser comentada. Para ser breve e sistemático, algo que raramente sou, dedicarei um parágrafo a comentar cada um destes assuntos mediáticos, sem me alongar na desnecessária contextualização.

O caso do cão Zico e da comoção que o seu abate está a provocar é porventura o mais perturbador, porque contém várias provas de que o enlouquecimento do povo não é esporádico nem circunstancial. É, no entanto, baseado em premissas voláteis, sem sentido e, consequentemente, perigosas. A onda que se espalhou contra o abate do cão que matou a criança é das mais assustadoras provas de que as pessoas ainda não perceberam muito bem até onde pode chegar a questão da defesa dos animais. Quando chega a este ponto, é um fanatismo bem mais perigoso do que aquele seguido pelos defensores das touradas. Podem dizer o que quiserem sobre a santidade dos animais, da sua dor, da sua categoria na natureza ser a mesma que a nossa; nunca me convencerão de que o pitbull em questão, ou qualquer outro animal da história do planeta, conseguirá sentir um milésimo da dor que os pais da criança estão a sentir, ao verem que a sociedade se preocupa mais em salvar o cão do que em manifestar desagrado pela morte do filho; e, no processo, prefere culpar os pais enlutados. Se me dessem a escolher entre uma caneta para assinar uma tão desprezível petição e uma caçadeira para matar o cão na hora, os dentes que perfuraram o crânio de um bebé de 18 meses iam ficar estilhaçados com o chumbo. Daniel Oliveira escreveu no Expresso tudo aquilo que eu mais poderia dizer sobre o assunto, e prolongar-me mais seria parafrasea-lo. O próprio artigo do cronista originou polémica, e quase todos os que se opunham à sua opinião faziam-no com a ressalva "Eu concordo com quase tudo o que ele normalmente diz, mas neste assunto não". Eu assumo que comigo passou-se exactamente o oposto.

Passemos ao caso de um animal ligeiramente mais racional: a famigerada Pepa. A Pepa foi crucificada em praça pública por manifestar um desejo consumista: atingimos o cume da montanha da hipocrisia. Mais uma vez, temos um caso de má interpretação de valores. Tudo o que fuja ao politicamente correcto é escandaloso. Isso não é ter valores, é histeria e vício de indignação, sem deixar de referir o preconceito incrível sobre a senhora pela pronúncia dela. Se houver uma petição para oferecer uma mala à Pepa, eu assino e contribuo.

Por fim, temos o caso de Massoud Adibpour, um jovem que está a fazer furor nas ruas de Washington, ao exibir mensagens de optimismo a condutores e transeuntes. Essa pequena gota de óleo contaminou já o oceano que é a internet, e o rapaz prestou já declarações a vários meios de comunicação internacionais. Eu tenho uma opinião muito própria sobre o optimismo, que aqui exponho: a felicidade e as expectativas têm de ser sempre relativas às circunstâncias da realidade. A felicidade é sempre moldada pelos factos. Se os factos forem positivos, a sensação resultante é boa. Se os factos forem negativos, os sentimentos serão conformes. Se as coisas não decorrerem desta forma, algo funciona mal. Ser optimista é ser feliz em más circunstâncias. É louvável, mas anormal, e irresponsável. O copo, muitas vezes, não está só meio cheio. Está meio vazio, e é preciso encarar essa metade vazia como tal. Senão vamos ficar surpreendidos quando o copo chegar ao fim, porque não consideramos que metade já não existia. Em relação a este rapaz em específico, aparenta ser um anormal que tenta espalhar motivação pelas pessoas que se deslocam aos seus trabalhos, para fazerem algo de realmente produtivo com a sua vida.

Deixo aqui também, não uma petição, por ser mais improdutiva do que aquela que pedia a demissão de Miguel Relvas, mas um sincero pedido: ignorem os pintelhos. Eu, excepcionalmente desta vez, não os ignorei para ilustrar o quão irrelevantes estes deveriam ser. Não comentem, não discordem, não concordem, não se indignem, não partilhem, não coloquem "gostos" no Facebook. Só assim vamos, a pouco e pouco, criar um espaço de discussão pública em que o Zico, a Pepa e o Massoud terão o fim que todos devemos concordar: o seu abate. Mas outro tipo de abate: o mediático.

2 comentários:

  1. Caro Diogo, peço desculpa por este pequeno comentário. Mas creio, na minha opinião, que o Sr. não percebeu a critica subjacente à opinião publica. Segundo o que percebi, a maior critica não seria devido ao seu magnifico sotaque, e ao seu problema de mobilidade mandibular.
    Creio, na minha humilde opinião, que a critica está na mensagem deixada e no seu contexto.
    Se a Pepa tivesse dito exatamente aquilo, no Urban, já com uma taxa de álcool no sangue e a falar anonimamente com os amigos, não seria de todo criticável.
    Agora, na situação social que vivemos, utilizando um tempo de antena como o da Samsung, dizer que o seu mair desejo para 2013, que se espera ser o pior da história contemporânea, é o de ter dinheiro para comprar uma mala???
    Se para si, a futilidade não é criticável, eventualmente as nossas influencias religiosas, que de certo saberá ser bastante profundas na nossa sociedade já há meia duzia de séculos, para o resto da sociedade provavelmente será.

    Creio que a base do problema nem será o de ter sido ou não politicamente correta. Porque haveria muita outra forma de ser politicamente incorreta. Mas levar a sua futilidade a este ponto, para mim é mais do que criticável.

    Permita-me usar um argumento seu, contra a sua própria critica. Desejar o fútil, não é utilizar "premissas voláteis, sem sentido e, consequentemente, perigosas"?
    Utilizou um argumento básico, que é a do peso dos valores de cada um, que no seu caso, dá mais peso ao valor da morte de um ser humano, do que da morte de um cão ("Se me dessem a escolher entre uma caneta para assinar uma tão desprezível petição e uma caçadeira para matar o cão na hora, os dentes que perfuraram o crânio de um bebé de 18 meses iam ficar estilhaçados com o chumbo."), comparando, não será politicamente correto dizer que se prefere lutar pelos direitos humanos, do que pelos direitos dos animais. Que estará ao mesmo nível de desejar uma mala da chanel, e não o de ter saúde e que o nosso país possa sair da situação em que se encontra.

    Não sei se consegui ser elucidativo na minha opinião. Não é uma critica pessoal nem à sua opinião, mas apenas aos seus argumentos utilizados.

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  2. Diogo, ando tão saturada de ler sempre a mesma coisa sobre o Coelho, o Relvas, o Gaspar, que fico grata de ler as notícias mais estúpidas do mundo.

    O Zico é um animal irracional!

    Por onde andavam os pais do Dinis, ditos racionais, quando deixaram uma criança de 18 meses sem vigilância, sabendo que tinham um pitbull preso num cozinha escura.

    A Glória Araújo, deputada socialista, foi detida numa operação stop, na madrugada de sexta-feira, em Lisboa, depois de ter acusado 2,41 gramas de álcool por litro de sangue, um valor que prefigura crime. O Código da Estrada estipula os 1,2 gramas de álcool por litro de sangue como o valor a partir do qual a condução de veículos é considerada crime.

    Caso a deputada socialista, outro animal racional, tivesse originado um acidente e, nesse acidente morresse uma criança?

    Também querias que ela fosse abatida?

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