segunda-feira, 7 de julho de 2014

Roger

Roger Federer é um tipo simples. A esposa está esteticamente distante das super-modelos que normalmente abrilhantam as bancadas dos jogos dos cônjuges e namorados (ver, a título de exemplo, a mulher mais deslumbrante do mundo). Juntos têm dois pares de gémeos e é impossível, ao ver aquela família, não imaginar um lar agradável e harmonioso. O jogo do suíço é tão natural e relaxado quanto parece ser toda a sua vida. Como desportista, conquistou tudo; ao juntar a sua genuinidade humana, conquistou uma legião mundial de fãs. Roger é um homem inteligente, um gentleman cordato e ajuizado. Tem o ar confiante, discreto e ponderado que faz toda a gente afirmar sem reservas que lhe confiaria os filhos só de olhar para ele. No court e na rua, demonstra uma invejável compostura (excepção feita a estes deliciosos bloopers numa entrevista a Pedro Pinto, e estes, ainda mais irresistíveis, com Nadal, numa publicidade a um jogo de caridade). E, por referir o espanhol, os seus duelos históricos com Rafa são tão épicos que até os leigos do ténis apreciavam a rivalidade no seu apogeu, naquele contraste de estilos tão gritante.

Wimbledon é o meu torneio predilecto. Não sei dizer se é a graciosidade estética do verde da relva, se os tradicionais equipamentos brancos, se o ritmo frenético de jogo. É onde o ténis atinge o seu ponto mais legítimo. Foi para ser jogado em Wimbledon que o jogo foi inventado.

Djokovic, o seu oponente na final de ontem, é um adversário à parte. Tem uma regularidade e firmeza inéditas no circuito. Em qualquer que seja o terreno, qualquer que seja o adversário, a vitória de Djokovic é altamente expectável. Isso é ao mesmo tempo admirável e fastidioso. O seu jogo parece previsível, monótono, e no entanto é de uma eficiência notável; escolhe sempre o movimento certo no momento certo, e combina-o com execuções técnicas irrepreensíveis. Djokovic nunca perde o ponto, é preciso ser o adversário a ganhá-lo.

Federer não é desses aborrecimentos: limitar-se a responder é de uma simplicidade ultrajante. Roger quer fantasia, quer vertigem, quer tornar o impossível realizável à frente dos nossos incrédulos olhos. A recuperação do quarto set é um triunfo psicológico brutal, ao trepar o iceberg que é Djokovic com 5 jogos consecutivos de concentração, crença, perseverança e mestria. No quinto set, cedeu o jogo de serviço que não podia ceder. Não é assim que terminam os filmes.

Depois do pior ano da carreira, sem sequer atingir uma final de Grand Slam, Federer deixava-nos tristes. Nada temos a ver com o assunto, mas a queda de um génio põe-nos sempre comovidos. Esta final de Wimbledon era, para Roger no seu auge, o mínimo exigível. Para um Federer questionado pelas exibições medíocres, repleta de erros e de uma excruciante falta de confiança, foi mostrar que pode-se perder a forma, podem-se perder encontros, mas a capacidade de nos fazer contemplar o seu jogo com a admiração apenas destinada aos grandes artistas é algo que irá perdurar nos courts, e no nosso imaginário.

2 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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    1. 5 anos de diferença é muita diferença.

      (nem sei como apaguei o comentário anterior...)

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